sábado, 26 de junho de 2010

Passado

   - Eu estava pegando meu livro - peguei minha bolsa que estava próxima e coloquei rapidamente o livro cuja capa dizia "sacrifícios" dentro. Me embolei um pouco para pegar o meu livro de História que eu havia trazido. Acabei por derrubar alguns objetos da estante atras de mim. Um deles pude perceber que era um abajur. - Opa - Dei um sorriso meio constrangido. Na verdade eu estava totalmente constrangido. Mas não interessava mais pois eu estava com o livro que podia me dar todas as respostas em minha bolsa.
  - Hum - murmurou ele, não parecendo desconfiar. Caramba! Será que eu sou tão desastrado assim a ponto de não conseguirem desconfiar que estou fazendo algo errado? Tentei ficar feliz com isso.
 - Não tinha ido no banheiro?
  - Já fui. Por que? fuçou muito em minha ausência? - ele olhou para mim com cara de sério e por um momento achei que ele estava falando sério. Mas depois ele sorriu e percebi que brincava.
  Se sentou ao meu lado e começamos a discutir sobre o trabalho. Se eu não soubesse que ele fazia parte de um grupo de adoradores do demônio eu podia dizer que Andre legal.
Meu celular vibrou e vi que eu havia recebido uma mensagem. Era de Andressa. Olhei para a tela e vi o que ela escrevera.


Renan. Tudo bem?
Alguma novidade?


Teclei rápido para que André não visse. Achei algo que talvez te interesse. Já já eu volto para casa.
Eu estava com medo de André perceber que lhe faltava alguma coisa. Mas parecia até que ele nem sabia uq estivera lá. Não se preocupava em deixar a bolsa à vista. Estranho!
Na vez em que ele me ligara, seu numero ficou gravado na memória do meu celular. Esperei ele estar totalmente concentrado no trabalho a frente no computador e disquei do meu celular o número. Eu ganhava bônus todo dia mesmo. O telefone na sala tocou. Ele correu atender dizendo "Já volto". Ouvi o telefone tocar, tocar e tocar e ele atender: "Alô". Ele ficou dizendo isso por um minuto mais ou menos. "Quem ta falando?". Enquanto isso procurei por mais alguma coisa naquele quarto. Vasculhei alguns lugares mas não achei nada. Então me preparei para quando ele voltasse.


O tempo passou voando e terminamos nosso trabalho. Me despedi de André e fui para casa.
A rua para minha casa era estreita, cheia de curvas. Minha casa ficava a apenas um quarteirão dali.
Eu andava por esta mesma rua estreita quando senti que estava sendo seguido. Olhei para trás e não vi ninguém. Olhei para frente e vi um mendigo sentado na esquina com uma garrafa na mão. Vestia trapos marrons. Era só minha imaginação. Passei pelo mendigo e quando virei a esquina me virei para me certificar de que não estava mesmo sendo seguido. O mendigo estava de pé. Tornei à frente porem eu ainda estava intrigado com o mendigo. Olhei atras novamente e o mendigo estava correndo. Ele corria atras de mim.
O que me deu vantagem foram as curvas. Eu já estava próximo de casa mas para um velho barbudo e grisalho ele era muito rápido. Meu Deus! O que aquele cara queria?
 - O que você quer? - gritei.
  - Eu quero ela, Renan - respondeu o velho. Mas aquela voz... aquela voz não me era desconhecida. Era a voz de Vitor.
Continuei correndo até que vi uma luz cegante à minha frente e parei antes que fosse atropelado pelo carro que vinha. Dei caminho para o carro e seu motorista, que passou gritando "Sai da frente seu louco!". O mendigo, como se o motorista do carro não o tivesse visto, fora atropelado. Procurei por um corpo mas não achei nada. Será que eu estava ficando louco?


Cheguei em casa e chamei por Andressa. Ela não respondeu. Chamei por Rosa e ela também não respondeu. Então vi algo se movendo para frente e para trás numa constante. Levei um susto quando Rosa olhou para mim com os olhos inchados. Ela deveria ter chorado.
 - Olá, Rosa.
Ela não respondeu. Continuou em seu balancê sentada no chão da sala da pensão.
Eu subia a escada que daria a meu quarto quando olhei para o corredor e vi o objeto mais inesperado do momento. Um copo.
Agora me lembrava. Não era qualquer copo. Era o copo que usamos para fazer aquele ritual. Estremeci só em pensar naquele jogo imbecil.
Me encaminhei pegar o copo de vidro para guarda-lo em seu devido lugar. Qual foi a razão de ele ter feito isso? fora a ultima pergunta que eu fizera antes do negócio endoidar. Agarrei o copo e então aconteceu.


Tudo que estava a minha volta começou a se desfazer. As paredes eram destruídas e jogadas para o ar. De repente começavam a se reformar, porém, agora, formando um novo lugar. Eu já não estava mais em casa. Eu estava na entrada de uma casa velha e quebrada. A rua que a cercava estava vazia. Havia outras casas à volta mas parecia que essas estavam à venda pois não eram habitadas. De longe podia ver alguém chegando. Eram dois rapazes e carregavam um outro nas costas. O da direita era Bruno. Esse eu reconheci de longe. Agora o da esquerda... Não sabia era. Eu sabia que já havia visto ele antes. Devia ser alguém da escola.
Eles entraram na casa abandonada e eu os segui.
Havia um sofá todo rasgado naquilo que deveria ser a sala. Os rapazes colocaram o outro deitado no sofá, e foi só então que percebi quem era aquele garoto. Era Vitor. E parecia estar desacordado. Na verdade parecia estar morto. Sua pele estava totalmente pálida e desidratada. Estava de boca aberta e não parecia respirar. Seus olhos estavam vidrados.
  - E agora, o que a gente faz, cara? - perguntou o garoto que eu não sabia o nome.
 Bruno balbuciou, nervoso. Andou de um lado para o outro coçando a cabeça e o queixo.
  - Já tentamos de tudo? - perguntou ele.
  - Acho que já. Ele morreu, mano - disse o que eu não sabia o nome. Ele estava desesperado. Dava-se para ver na cara dele que ele se arrependera de algo que fizera.
 O garoto começou a chorar. Entre soluços murmurava coisas como "O que eu fiz?", "O que eu estava na cabeça?".
Bruno estava sentado no sofá ao lado, olhando para baixo. De repente levantou a cabeça e fitou o colega a chorar. Se levantou e andou para atras dele. Virou-se em direção a janela quebrada e andou até ela. Lá haviam vários cacos de vidro espalhados pelo para-peito. Um mal pressentimento me ocorreu. Ah, não. O que ele vai fazer?
"Bruno, não" eu dizia mas minha voz não produzia som. "Bruno, não!".
Ele já estava com um caco de vidro na mão e ia em direção ao seu parceiro no chão derrubando lágrimas e mais lágrimas.
  - É difícil - disse Bruno. - Mas as vezes temos que fazer certas coisas desse tipo.
E o choro se cortou.
Eu vi o sangue escorrer pelo chão no qual o garoto agora estava esticado, sem reações, com a garganta cortada.
Meu estômago sofreu um breve embrulho.
Vitor estava deitado no sofá, parecendo um maracujá murcho. Seu braço estava estirado e tocava o chão. Então algo incrível aconteceu.
Como se fosse uma esponja, a pele de Vitor foi absorvendo o sangue que estava no chão. O liquido vermelho subiu pelo braço dele e foi adentrando sua pele a tornando totalmente corada e hidratada de novo.
Bruno estava sério.
Vitor abriu os olhos.
Lentamente ele se levantou do sofá. Estralou os dedos e esticou os músculos.
Pulou o garoto morto no chão e foi para a porta. Bruno o seguiu sem dizer nada.
  - Quanto tempo eu tenho agora? - disse Vitor sem olhar para trás, seguindo um caminho que eu desconhecia.
  - Tem mais dois meses agora - respondeu Bruno.
  - Dois meses? não é muito tempo.
  - Não.
  - Tá o.k. Vou tentar não chamar muito a atenção em cinco meses e conhecer alguém bem interessante.
  - Não há mais tempo.
Vitor olhou para Bruno.
  - Como?
  - Não há mais tempo. Pág. 96.
Vitor olhou incrédulo para Bruno mas então seguiu seu caminho.




Eu, então estava de volta para minha casa, a pensão. O copo estava quebrado.
Tentei fugir. Não sabia do que mas queria apenas correr. Daquela visão, daquele copo.
  - Renan?
Virei-me bruscamente e me deparei com Andressa.
  - Está tudo bem?...
Agarrei-a pelos ombros e a sacudi de leve. Eu estava desesperado.
 - Andressa - ofeguei, - há quanto tempo conhece Vitor?
Andressa me arregalou os olhos. Agora estava assustada.
  - Há quatro meses... e meio. Por quê?
Agora eu entendia. Agora eu sabia o porquê de ele ter tentado matar ela.
  - Andressa, eu... - eu dizia quando alguém bateu na porta. Isso foi um segundo antes de ela ser derrubada.
Andressa e eu recuamos para trás e vimos Rubens entrar na sala.
 - Ru-Rubens? - gaguejei. - Por onde andou. A gente te procurou...
Ele pulou em cima de mim. Pude sentir, em minhas costas, que ele fizera um buraco na parede da sala, abrindo então uma passagem para cozinha. Ele estava diferente. Seus olhos estavam totalmente dilatados e por fora das pupilas, tudo era vermelho.

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