domingo, 4 de julho de 2010

Minha fonte

    Não conseguia falar, ele prendia meu pescoço. Estava me sufocando.
Eu apalpava o chão ao meu redor em busca de algo que eu pudesse usar para acertá-lo. Mas não achava nada. Eu morreria ali. A ultima coisa que eu veria seria aquele olho vermelho da cor do sangue. Aquele olho antes amistoso, agora assassino.
Eu já perdia a visão quando senti o baque da cabeça de Rubens sendo acertada por alguma coisa.
Demorei um pouco para recuperar a visão mas logo consegui ver Andressa segurando uma panela. Ela estendera a mão para mim. "Vem!", ela disse. Eu segurei sua mão e logo meu corpo recuperou todas as minhas forças. Minha visão ficou perfeita de novo e até mais aguçada; aguçada o bastante para ver o reflexo de Rubens no vaso atras de Andressa. Rubens viria por trás.
Pensei em algo. Pensei em algo que vinha me incomodando há muito, que hoje, talvez eu provaria.
 - Andressa - disse alto o bastante para que ela ouvisse e virasse para mim. Puxei seu corpo junto ao meu e a beijei.
O tempo parou. Não sei quanto na cabeça de Andressa, mas parou para mim. Eu conseguia ouvir seus pensamentos tão lentamente como se ela os tivesse recitando. Podia ver tudo ao meu redor. O mundo ficou em câmera lenta. Poderia ver uma mosca voando na maior velocidade possível como se ela estivesse engatinhando sobre suas patinhas finas.
Era isso. Andressa era minha fonte. Era Andressa me dava força. Me dava poderes.
Tirei meus lábios dos seus e ela caiu no chão. Virei-me pronto para atacar Rubens. Não sabia como, mas agora eu estava pronto. Eu tinha força o suficiente para brigar com ele. Para matá-lo.
Senti um tremor dentro do meu corpo. Rubens avançou em um pulo para cima de mim e eu revidei com um soco. Ele voou quebrando mais paredes, abrindo mais buracos na pensão - Não vou querer estar aqui quando minha tia Bete vier vistoriar a pensão.
Rubens levantou meio cambaleando, soltou um ruido estranho e esganiçado que me lembrou o som de uma águia, e avançou andando, lentamente,  para cima de mim de novo. Nesse momento, Rosa apareceu na frente de nós dois. Ficou no meio do confronto. Olhando para Rubens.
  - Rubens- disse aos soluços, - você voltou...
Rubens a agarrou pela cabeça e a jogou violentamente para o lado. Pulou para cima de mim e eu pulei de encontro. O baque do encontro foi quase como uma explosão. As paredes racharam e partes do teto caíram. Ele me deu um empurrão - do mesmo jeito como um tigre faz - que me fez cair de canto. Logo ele estava em cima de mim com suas mãos em meu pescoço de novo. Dessa vez, porém, me jogou contra uma parede e foi em direção a Andressa, que estava deitada no chão inconsciente.
Quando me levantei, Rubens estava com Andressa nas costas. Isso bastou para me deixar furioso.
Avancei com toda a minha velocidade(que eu não sei de onde vinha, embora eu tinha minhas hipóteses). Ele fez a coisa mais estranha do mundo: deu um salto e se agarrou à parede ao lado. Com Andressa nas costas, ele escalou a parede e subiu até o teto. Deu um murro e abriu um buraco enorme no teto da pensão. Entrou por este e foi lá para cima.
O que eu faria agora?
Olhei ao redor à procura de alguma coisa que me ajudasse mas nada achei. Sai pela porta da frente e olhei para cima. Não conseguia vê-lo, ele estava lá em cima ainda.
Me agarrei no parapeito da janela do quarto de Rosa e dei um impulso e me levou mais acima. Consegui, finalmente, me agarrar ao teto. Me esforcei para subir e consegui colocar meu braço inteiro na telha.
De lá consegui ver Rubens, de frente para mim, olhando para cima. Seus olhos totalmente vermelhos agora, fitavam, assustados, algo no céu que eu não via. Ele se preparava para sair correndo quando algo veio voando e o acertou em cheio quando se virou de costas. Eu quase não percebi, mas Andressa estava agora suspensa no ar, vindo em minha direção. Me soltei do teto e dei um impulso para trás. Consegui agarrá-la no ar antes de cair de costas em cima do carro do vizinho que disparou o alarme contra roubo.


  - Que merda é essa!
Eu ouvia vozes mas não conseguia raciocinar direito. Abri os olhos bem lentamente e logo a consciência voltou.
O vizinho gritava nervoso e me ameaçava mas eu não conseguia entendê-lo. Levantei e sai de cima do carro. Agarrei Andressa no colo e levei-a para dentro de casa. Casa essa que estava quase totalmente destruída. O vizinho me seguiu, chiando. O ignorei e entrei em casa. Acho que ele chamou a policia pois ele sacou o celular do bolso e logo estava gritando. Não ouvia uma só palavra que ele dizia. A rua agora estava lotada de gente. Todos olhavam minha casa e o carro do vizinho destruídos. 
Entrei na sala e fui para a cozinha - ambas destruídas. - Coloquei Andressa deitada na mesa e empurrei tudo que estava em volta. Ela voltaria à consciência em breve.
De repente me lembrei de algo: o livro. Mas onde eu o guardara mesmo?
Forcei minha mente até que recordei.
Havia deixado minha bolsa na sala. Então fui para lá. Procurei tudo que é canto mas não achei. Então ouvi passos e alguns crecs. Olhei ao redor, vinha do meu quarto. Subi as escadas com o maior cuidado para não ser ouvido.
No caminho peguei um pedaço de telha caída. Não sentia mais força em mim.
Olhei pela porta aberta e lá dentro vi um homem apenas de calça de moleton, pés descalços e tronco nú. Ele era grande... digo... Tá, o cara tinha músculos.
Era branco e louro. Seus cabelos eram curtos, sem corte definido. Ele segurava um livro na mão. O livro que peguei na casa de André.
Me preparei para atacar mas fui surpreendido com uma voz extremamente grossa e estrondosa. Parecia um trovão.
  - O pai não vai querer que faça isso Renael.
Eu larguei a telha de susto. Ele continuava a analisar o livro.
 - Quem é você? - perguntei com a voz meio trêmula.
Ele se virou e sorriu para mim. Seus dentes eram de um branco brilhante. Seus olhos eram verdes e ele tinha uma luz que parecia emanar de dentro dele próprio.
  - Ora, eu sou seu irmão.
O olhava fixamente. Será que ele era louco ou coisa assim?
  - Sou Gabriel - continuou ele, - o mensageiro.
Contraí o rosto.
 - Mensageiro do que exatamente?
Ele não respondeu. Ficou me analisando. Me olhou da cabeça aos pés com cara de desconfiado, me pegou os ombros e me girou para olhar minhas costas. Me soltei e disse:
 - Que pensa que...
  - Você ainda não é...
Ele parou com expressão de quem acaba de fazer besteira.
 - Não sou... - incentivei-o a continuar.
Ele virou de costas e apontou para a parte nua.
  - Consegue ver?
Ele era louco, sim!
 - Ver... o que?
Ele se virou de novo.
  - Ah, não. Você ainda não é. Eu não deveria estar aqui. Eu vi você batendo no Rubens e achei que já tinha virado...
Eu estava começando a ficar assustado.
 - Desculpa. Mas do que você está falando?
Ele não se ocupou em responder.
  - Tome - ele me entregou o livro. - Escute, Renael. O que está por acontecer é mais sério do que parece. Rubens e quem estava por trás dele são apenas fantoches de algo realmente ruim. O céu já não é mais o mesmo. A terra está cada vez mais provocativa. Os seres do mundo inferior estão se rebelando. E tudo que conhecemos hoje está prestes a mudar. Proteja Andressa com sua vida. Ela será a coisa mais importante para você em breve.
Ele foi em direção à janela e virou-se para mim.
  - Sabe pilotar moto?
 - Sei, sim. Por que?
Ele se limitou a sorrir e depois pulou a janela. Corri para ver se ele tinha caído e se machucado - ou morrido, mas ele não estava lá. Havia sumido.
Mais a frente via uma motocicleta nova, modelo Twister.
 Logo se ouvia as sirenes da polícia, que chegaram à minha rua. Entendi o porque, mas não entendi como Gabriel fizera aquilo.


Eu estava com o livro na mão.
Aquele era o momento.
Abri-o e folheei até a página 96.


O RITUAL DA VIDA ETERNA E POPULARIDADE:


O ritual consiste em oferecer uma alma a Tomáz, o anjo caído.
Com o sangue da oferenda deve-se fazer um elixir e tomá-lo
Após isso, Tomás te dará tudo o que precisa. Mas ele também
irá querer oferendas ao longo de sua vida. Sendo as oferendas
de 2 em 2 meses.
A necessidade bimestral pode ser suprida com o sacrifício de
de um amor verdadeiro. Sendo assim, não precisará mais de
sacrifícios.


Achei a resposta.

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